segunda-feira, 30 de junho de 2008

Um acaso nunca vem só – Live from Duplex 76

Depois de ter destilado o álcool das últimas 3 noites com muita canela e pastel de nata, já consigo alinhar ideias. Vi que apesar de umas quantas mudanças de clima não tenho escrito grande coisa. Vi que por momentos achei que estava a perder o dom de atrair acontecimentos estranhos. Vi que não tinha nada com piada para dizer.

Deixei para trás tudo o que não era bom para mim e agora vivo entre os Prazeres e as Necessidades. Literalmente. Tenho um duplex lindo com muitos pombos e muitos vizinhos que cospem para o chão, outros coçam-se e cuscam à janela, 5 lojas do chinês, 4 restaurantes japoneses, 2 nepaleses, 1 tailandês, 50 portugueses... 1 bingo, 1 jardim e 1 palácio para passear. Já era “habitué” do japonês até que descobri há uns dias que o tipo morou nesta mesma casa e águinha boa aquele corpinho nunca viu. Isto narrado pelo senhorio-filho-vizinho de baixo, cujo senhorio-pai-vizinho da frente é amigo do libanês-vizinho do lado. A única vez em 180 anos que este prédio foi assaltado moravam cá 4 ou 5 polícias (no mesmo apartamento). Entre as personagens que já passaram pelo condomínio das varandas azuis gostava especialmente de ter conhecido o ninja que todo o dia via desenhos animados.

Mas falava eu no início do parágrafo de limpezas. Há quem as faça todos os dias, há quem nunca as faça. Eu fiz uma de Primavera. Tirei cortinas, mandei tapetes fora, mudei a disposição dos armários, esfreguei a porcaria entranhada nas frestas dos azulejos, deitei fora todas aquelas peças que vamos guardando e já não nos servem para nada a não ser ocupar espaço e criar pó. E não fiz substituições. Deixei prateleiras e parapeitos vazios. E não estou a falar da minha casa.

A vida agradeceu-me a desinfecção e teve uma grande atitude. Nunca a tinha visto falar assim comigo mas tocou-me no ombro, piscou-me o olho e disse-me naquele jeito meio gozão, “Vês… pensas que és esperta mas não me controlas…”. E riu-se. Riu-se o fim-de-semana todo. Riu ela, eu, ele, os amigos dele. Por obra e graça do espírito do acaso fiquei a conhecer instituição dos cansados à nascença, um dos seus membros mais ilustres, as duas filhas, e outras pessoas especiais. Entre concertos inesperados, pequenos-almoços de garoupa e jantares de degustação etílica, ficou-me o sabor a sal na pele e mais meio bronze à camionista. Piadas à parte, escrevo porque conheci pessoas de facto especiais e não podia deixar de o partilhar. Pessoas que apesar da história de cada um, ajustaram-se por acidente, por uma muito feliz casualidade, dispuseram tempo e boa disposição sem pretenderem nada em troca, mais do que um sorriso, do que uma gargalhada. Pessoas que conseguiram transformar 2 noites e 1 dia em férias de Verão. Um misto de Verão Azul com a Ilha da Fantasia, anões e fatinhos brancos à parte, com todos os desejos satisfeitos. Quinta-feira fechei os olhos e pedi um desejo. Hoje, Domingo, fecho os olhos com o desejo realizado. Só não vi estrelas porque o planetário já estava fechado.

Porque a minha veia dramática e os meus devaneios literários me levam a acreditar no lado mágico destes imprevistos, agradeço ao senhor da cartola com o coelho na mão. Ou com os bilhetes para o concerto na mão.

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