domingo, 21 de dezembro de 2008

Twinkle Twinkle Little Wrinkle

Hoje tenho que escrever. Não é porque o espírito natalício que me salte na veia, mas porque me esqueci do saco com os livros e os jornais na rua e já li tudo o que tenho cá por casa. Também me convém ocupar os dedos e a boca, para ver se não cedo à tentação e ataco o paquistanês mais próximo, em busca de umas passitas de nicotina (e já estou atulhada de batata doce).

"Si, cariño, dáme dáme... ese regalo que está bajo el arból"

Ainda a propósito do natal. Não sei se as pessoas que vi há pouco deitadas no chão do Zimbabué, se andam a treinar para espreitar debaixo da árvore à procura das prendas, se sonham com uma filhoz ou rabanada imaginária, se hei-de acreditar no jornalista quando diz que já não se levantam porque lhes falta a força, porque lhes falta a comida. E não é preciso ir tão longe, basta subir aqui a rua.

Atenção, não tenho absolutamente nada contra a hipocrisia do natal, pelo contrário. Gosto bastante. Gosto das luzes, das prendas, do bacalhau e do recheio do peru. E dos alperces secos. E dos espanhóis. Se algum dia, por algum acidente no universo, a minha descendência for mais do que 9 sobrinhos e 17 pombos, vamos ser espanhóis. O "Si, cariño, dáme dáme... ese regalo que está bajo el arból" só vai acontecer no dia de reis. Aí sim, foi quando a criança recebeu os presentes, com toda a certeza torcida com frio e com o cheiro da merda da vaca há tanto dia enfiada no estábulo. Além de que, em Janeiro já começaram os saldos...

O mistério divino da pantufa aquecida

Como já se nota, depois do telejornal de hoje, fiquei com algumas dúvidas existenciais. Será que a crise chegou ao Vaticano? Será que o papa dorme de pantufa Prada e botija para aquecer o santo pé? Será que a sua fé diminui por ser aquecida? Então porque raio os velhotes de trás-os-montes tem que antecipar a sua missa do galo ou nem a fazer, devido ao frio que faz na igreja? Já pensaram que se as igrejas fossem um sítio acolhedor, talvez tivessem mais clientes, ai!, crentes?

Twinkle Twinkle Little Wrinkle

Desde que soube que ia fazer 30 anos, comecei à procura de uma razão para me deprimir. Isto porque já nem é preciso dizer que tenho um certo gosto por dramas e clichés, todos sabem. Não será por acaso que a data do meu aniversário coincide com a comemoração do dia em que Van Gogh corta sua orelha esquerda, a leva para um bordel e a dá a uma prostituta chamada Raquel.

Quero ter a minha própria crise dos 30. Não percebo como não me ocorreu de imediato apelar à minha família. Em apenas 40 escassos minutos encontraram-me as rugas e as olheiras, chamaram-me velha, cansada e ainda levei umas pancadinhas nas costas a relembrar que os trinta estavam aí. Desta vez safei-me do TÁS GOOOOORDA.

No dentista explicam-me que não estou a ir para mais nova. No trabalho dizem que tenho muita bagagem e perguntam-me como era, quando eu era nova. À porta dos concertos perguntam as horas a esta senhora...

Mas que porrrrrra! Mas afinal quem são os trinta que estão aí, que toda a gente de diz que me batem à porta?? Os trinta ladrões? Os trinta anões? Os trinta milhões??

A volta ao meu mundo em 21900 dias

Não quero saber quantos anos tenho ou faço. Quero sim saber é o que faço com cada dia que passa. Em teoria tenho para viver pelo menos duas vezes mais do que já vivi até agora. Cerca de 21900 dias.

Amigas dizem que é aos trinta anos (ou seja, aos 10950 dias) que as mulheres sabem o que querem. Esta sabe e fez uma lista. Porque quero viver com todos os luxos a que tenho direito: tempo, verdade, coragem e vestidos com o sapatinho a condizer. Sem medo, esta é a minha lista de desejos:

- Quero aprender a patinar e quero uns patins. Porque ando a patinar há muito tempo sem patins.
- Quero ir a uma marisqueira e comer até lamber os dedos e arrotar a cerveja. Para comemorar com pompa e circunstânia a minha possível futura entrada nos apreciadores de marisco, depois de trinta anos de ausência.
- Quero aprender a pintar as unhas sem me atirar de lado para dentro da banheira, praguejar e colar os dedos das mãos aos dos pés.
- Quero ir à ópera pela segunda vez. Ao ballet, ao teatro, às exposições, às feiras. E ao circo... quero ir ao circo pela primeira vez.
- Quero brilhar no escuro com o meu novo aparelho nos dentes.
- Quero curar a minha procrastinação crónica, ainda que já tenha ouvido chamar nomes mais bonitos à preguiça.
- Quero iniciar um movimento social, com um manifesto anti-projecção de saliva fermentada. Objectivo: banir, punir as excreções e secreções abundantes, sonoras, protegendo-nos de escorregarmos numa qualquer cuspidela e fracturar os dois braços.
- Quero afugentar das janelas os pombos e os homens das obras.
- Quero recitar novamente em coro vezes e vezes o poema de Augusto Gil da chuva e da neve, onde batem leve levemente. Se tiveram que o decorar, acusem-se!
- Quero uma ficha tripla para ligar a TV e o DVD ao mesmo tempo.
- Quero ir a Paris, Porto Rico, Nova Iorque, Argélia, Israel, Praga, Viena, México, Sicília, Uruguai, Argentina, Sevilha, Roma, Atenas, Indía, Viana do Castelo, Marrocos, Brasil, Goa e Macau, Angola, Moçambique. Já fui um conquistadoooor!

E foi assim que se passaram mais 2 horas de um dos 10950 dias, procrastinando a tese e a roupa por passar.
Valham-me os anos bissextos.