sexta-feira, 29 de setembro de 2006

Carruagem 23 – O Expresso da Pampilhosa

Começo já por pedir um desconto pois estas linhas estão a sair ao som da 17ª repetição do Caribe Mix, em plena praça pública. A dor de cabeça já é muito superior ao limite do aceitável. Muitas ou pelo menos algumas viagens se passaram desde os episódios da Esquina de la Super Chica, mas por falta de tempo, inspiração ou qualquer outra boa justificação, não escrevi. O certo é que estou em Mirandela desde ontem e é impossível conter a vontade de registar alguns dos melhores momentos destas últimas 24 horas.

O Expresso da Pampilhosa

Promovi o Intercidades com destino ao Porto a Expresso da Pampilhosa. Durante duas horas e meia, eu e toda a carruagem 23, aturámos a conversa de uma mãezinha no banco da frente, a discorrer um chorrilho de elogios ao filhinho, que entraria em Santarém. A senhora tinha vindo lisbotar e não se calou a viagem toda, preocupadíssima se o rebento conseguiria entrar no comboio. Ligou-lhe uma centena de vezes a confirmar se já estaria em posição na plataforma, E quando toda a gente aguardava o tão nervoso momento e a criatura entra, eis que se ouve um ahhh colectivo pois afinal, e ao contrário do que se esperava, o rapaz media 1,90 e tinha nada mais nada menos do que pelo menos 17 anos.

Claro que as viagens de comboio têm destas coisas. A verdade é que consegui fazer umas pausas na conversa e adormecer profundamente. Tão profundamente que acordei uma das vezes incomodada com o ronco de alguém. Para meu próprio espanto todos os outros passageiros estavam bem acordados… confesso que ainda demorei um pouco a admitir a origem de tão belo momento sonoro.

A boleia para Mirandela esperava-me em Coimbra, com chegada prevista para as 11h29. O revisor anunciou vezes sem conta a paragem na mesma mas esqueceu-se de um pequeno pormenor ou mais concretamente de uma pequena letra. B. Coimbra B. Como não sou de segundas escolhas e achei que B não era sítio para ninguém sair, não sai. Continuei a todo o vapor com destino a Pampilhosa!

Fui falar com o revisor, muito indignada, porque no horário estava a paragem em Coimbra e se mudaram, teriam que ter avisado. Ao que o aprumado senhor me responde muito pronto: A menina anda distraída! Eu avisei alto e bom som! Como habitual, rosnei com o sobrolho levantado e a resposta já foi diferente: Pronto. Não precisa de pagar para voltar para trás. Eu escrevo-lhe aí no bilhete. Pronto. Safou-se. Fiz uma tentativa de sorriso e não é que teve o descaramento de rematar com um “Mas olhe que a menina é que estava mesmo distraída”. Escusado será dizer que as rodas da mala ficaram-lhe marcadas no verniz do sapatinho.

Enquanto fazia o alegre caminho de retorno por Souselas, Vilela, Fornos e Adémia, a carrinha com os barcos e roulote (??) atrelada esperava já atravessada em Coimbra, e para cúmulo em Coimbra B… enfim.

Já não se fazem pneus como antigamente

Depois de uns quantos quilómetros, já na estrada de Mangualde para Celorico, o Portugal profundo assistiu em plena auto-estrada ao rebentamento e consequente derretimento de um pneu de uma roulote. Inundámos a estrada de fumo e fomos em procissão até à saída do lugar mais próximo. A julgar pelos apitos e acenos posso dizer que Celorico recebeu-nos em festa! Primeira oficina, paragem imediata. Acertámos em cheio na sobremesa do mecânico que não levantou os olhos para falar connosco enquanto não acabou a tigela de tremoços…

Depois de partirmos os cadeados calcinados para conseguirmos retirar no pneu suplente percebemos que não tínhamos rebentado só com as ditas fechaduras. Toda a parte de trás da roulote estava prestes a desfazer-se e levantar voo. Continuámos viagem com uma corda a toda a volta. Desenrrascanço nacional no seu melhor.

Parámos para almoçar no Lisboa à Noite… café de beira de estrada inspirado com toda a certeza nas noites de Lisboa em que falta a luz e o lixo não passa.

A Natércia das Alheiras

Depois de umas quantas voltas perdidas na serra finalmente desaguámos no Rio Tua, ainda a tempo de conhecer a Natércia das alheiras. O meu jantar foi bacalhau, mas também devia ser de caça, pelo tempo que demorou a chegar à minha frente.

Isto foi só para chegar. Agora vou ter a minha primeira experiência dentro de água com um par de remos...

P.S. 19h45 – A hora exacta em que fizemos a nossa entrada triunfal em Mirandela. Exactamente a hora a que chegaria se tivesse vindo de comboio regional…

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