segunda-feira, 6 de março de 2006

La Esquina de La Super Chica I

Estes são os primeiros episódios de uma telenovela mexicana que se prevê chata e demasiado saudável. Sim. Saudável. Sem tequilla, corona ou café expresso para aguentar as 6 da manhã todos os dias, com 12 horas de aulas sem perdão, não há muito mais a fazer para além de praticar o portuñol (vai sair daqui perfeito), reparar em pormenores idiotas e tentar não desesperar com a falta de comunicações. Não há um telefone para onde nos possam ligar, as cabines públicas funcionam após 37 tentativas e temos um tipo de ligação à internet muito própria. Conhecida nestas quatro paredes e meia janela como Internet Vai-Vem.

Depois de 11 horas de viagem e um tornozelo de elefante chegámos ao Centro Desportivo do Comité Olímpico Mexicano, na periferia da cidade. Sem dúvida um povo atencioso, prestável, de coração aberto e mãos estendidas ao que puderem apanhar.

Adoptada por 3 Mexicanos

O pouco que pude ver da cidade até agora impressiona. Pela diferença, pela grandeza, pelo cheiro, pela poluição, pela quantidade de pessoas. Imaginem o Martim Moniz em dia de feriado nacional na Índia e Paquistão, multipliquem pela quantidade de pombos no Rossio (ou na praça de S.Marcos em Veneza…) e aí têm uma aproximação da asfixia mexicana. Os 30 cm de espaço individual a que estamos habituados não existem nas ruas da Cidade do México. Pelo menos nas rua por onde andei.

Os 3 mexicanos que me adoptaram (Pedro, Jesus e Carlos) escoltaram-me nesta pequena incursão. Só me deixaram ir com eles ao centro da cidade porque no estaba muy aparatosa… pediram-me que fizesse um ar descontraído e nunca os perdesse de vista. Lá fui com a Santíssima Trindade comprar transformadores de corrente e adaptadores porque como é óbvio ninguém se lembrou que a coisa aqui é um bocadinho diferente… Um ficou na carrinha e dois saíram comigo. Tive que deixar a mochila e levar apenas o porta-moedas e sempre com a mão no bolso (para me certificar que de lá não saía). Achei tudo isto normal para uma cidade com um dos maiores índices de criminalidade até que vi um deles a tirar o próprio relógio e a deixá-lo também na carrinha. Aí comecei a ficar um pouco preocupada e fiz a pergunta idiota: as ruas são assim mesmo tão perigosas?? Tive um sorriso como resposta, uma troca de olhares entre os meus dois seguranças privados e después: “no… mas um fica sempre à tua frente e outro sempre por trás (vá… nada de piadas!). Não nos percas de vista e se por alguma razão isso acontecer assobia.”

Explicação: fomos a uma das zonas bastante perigosas. Não é assim em todas as colónias (bairros). Não vale a pena descrever o caos do trânsito. Basta dizer que vou sair daqui com a nítida sensação de que os mexicanos são daltónicos. Onde está vermelho vêem verde.

La Esquina de La Super Chica

Acabámos por nos encontrar novamente com a carrinha (entrámos no meio da estrada) en la esquina de la super chica, ou seja, onde eles tinham fixado anteriormente uma grande senhora, em todas as medidas, com uma t-shirt do Super-Homem. Podem imaginar o tamanho do logotipo na t-shirt, né?... E como os próprios não sabem o nome das ruas, entendem-se assim.

Depois da aventura fiquei a saber duas coisas: que a cidade tem muitas igrejas pois os espanhóis quiseram impor a sua religião e por cima de cada templo dos nativos, construíram uma capela ou construção semelhante. E que os transformadores não servem para nada e claro que as lojas mexicanas não fazem trocas nem devoluções. Manias de quem acha que percebe muito da coisa. Afinal bastavam os adaptadores.

Gatos Negros

Se gato preto é azar, estou sem sorte nenhuma. Enroscam-se três de cada vez nas pernas quando saio para o meu momento zen da noite. Fico à porta do dormitório masculino a impregnar ainda mais os meus pulmões com uma boa dose de nicotina. Masculino, pois claro. Para variar, não tinham quarto preparado para mim no feminino e então fui mandada para os fundos da Villa Veronil.

Dias conturbados

Quem andar a tentar fazer uma dieta mais vegetariana esqueça o México como destino de férias. Carne, carne, carne. Já decidi. A partir de amanhã vou passar fome. Carne três vezes por dia, chili e molhos de todo o tipo três vezes por dia, rebenta com a sanidade intestinal de qualquer um.

Análise FODA

Passo os dias completos enfiada na sala de aulas a tentar manter o meu padrasto acordado. Imaginem que têm 12 horas de aulas EM ESPANHOL de olhos fechados. Não é fácil. Mas também temos momentos de descontracção. Como por exemplo, quando os espanhóis insistem em utilizar o termo FODA mesmo após ter-lhes explicado o que significava em Português, e continuam a dizer bem alto várias vezes: estoy haciendo una foda o hay hacido muchas fodas com nuestros compañeros… ok ok. Passo a traduzir: FODA são as iniciais de um tipo de análise das organizações que é comum denominar SWOT (Strengths, Weaknesses,Oportunities and Threaths). Mas os nossos amigos como são pouco amigos do inglês, embirram em usar Fortalezas , Oportunidades, Debilidades e Amenazas. Alguns optam por DAFO. Mas como um dizia por lá, e verdade seja dita, depois de 3 dias a fazer análises DAFO, já é mesmo uma FODA.

Próxima viagem: Guatemala

O Vice-Presidente do Comité Olímpico Guatemalteco está encantado com o desporto adaptado português e em especial com o seu Presidente. Já está a fazer planos de alojamento para el Presidente, su mujer e su muy competente assistente. E fiquei a saber que Catarina na Guatemala é o cárter do motor… enfim…

Luta pela sobrevivência

Domingo é um dia especial. Domingo está tudo fechado. Ou meio aberto. A minha mãe resolveu aventurar-se pela colónia dos periodistas e ir à pelluqueria onde tínhamos estado ontem a cortar a barba de Sr. Ten. Cor. para tentar arranjar o cabelo. Ficou a saber que a chica que lo hace solo trabaja Domingo Si Domingo No. Estamos num Domingo Não. Tanto és assim que o refeitório onde comemos todos os dias fechava às 8 e ninguém avisou. Entrei por acaso às 8h30 e o empregado já estava fugir com os carros da comida. Tentei pará-lo com conversa. Expliquei-lhe que não sabia. Expliquei-lhe que se levasse o carro da comida eu não ia jantar porque não há outro sítio. Implorei. Nada. Impedi-lhe a passagem, agarrei o carro e fiz o meu melhor sorriso. Consegui. Carne outra vez, claro.

Agora vou por as lentes de contacto de molho nas tampas das garrafas de água porque me esqueci da caixa própria, respirar fundo e adormecer. Até à próxima vez que me conseguir ligar.

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